18 jan
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O Naufrágio da Liderança sem Gestão – iPL semanal número 41

As possíveis causas do naufrágio do navio Costa Concordia, no Mar Mediterrâneo, trazem à tona o desafio de combinar liderança e gestão, usando essas forças de maneira equilibrada. No caso do capitão Francesco Schettino, a mudança de rota sem planejamento, realizada para homenagear sua equipe, mostrou-se um erro fatal de gestão. No âmbito da liderança, faltou a ele consciência das possíveis conseqüências que aquele ato poderia gerar às 4 mil pessoas embarcadas.

“No ambiente corporativo, gestão trata da capacidade de atingir o planejado, a partir de uma estrutura organizacional dada e de pessoas que realizem o plano. É trabalhar com indivíduos qualificados, delegando responsabilidades, enquanto se elaboram sistemas para monitorar a realização das metas propostas”, explicou o Program Director do iPL, Carlos Ferreira. “Se compararmos com a atividade de liderança, o  líder é aquele que consegue alinhar as pessoas, construindo visões compartilhadas, desafiando processos estáveis, apoiando a formação de coalizões, engajando toda a equipe para a conquista do que foi proposto.”

No artigo “What Leaders Really Do”, o professor de Harvard John Kotter analisa a diferença entre liderança e gestão. Cada uma dessas duas atividades envolvem, de maneiras distintas e com objetivos muitas vezes diferentes, decidir o que precisa ser feito, criar networks de pessoas e relacionamentos e assegurar que essas pessoas realizem seu trabalho.  Por exemplo, nas organizações, os gestores conseguem administrar contextos complexos com planejamento, alocação de recursos e o estabelecimento de passos detalhados para alcançar seus objetivos de curto prazo. Ao contrário, liderar uma organização em busca de resultados no médio e longo prazo exige o desenvolvimento de uma visão, a partir da qual serão desenhadas estratégias que produzam as mudanças necessárias até que essa seja alcançada. Em muitas organizações, é comum líderes terem ideias sobre construção de visão e o engajamento de pessoas, mas muitos deles não conseguem entender a complementaridade entre liderança e gestão.

Para Kotter, gestão é copiar com complexidade. Suas práticas e procedimentos são respostas para um dos desenvolvimentos mais significativos do século XX: a emergência de grandes organizações. Sem uma boa gestão, empresas complexas tendem a se tornar caóticas e ameaçam sua própria existência. Boa gestão traz ordem e consistência para dimensões-chave do sucesso de uma companhia, como a qualidade e a rentabilidade de seus produtos e serviços.

Já, os líderes, não resolvem esses tipos de problemas ou organizam pessoas. Eles preparam organizações para mudanças e as ajudam a enfrentar os respectivos desafios. Liderança trata de copiar com mudanças. Parte da razão que tornou a liderança tão importante nos anos mais recentes é a maior competitividade e volatilidade dos negócios em todo o mundo, mudanças tecnológicas mais rápidas, acirramento da competitividade internacional, desregulamentação dos mercados, mudanças demográficas e da força de trabalho. Fazer o que se fazia antes, ou fazer um pouco melhor, já não é suficiente para o sucesso. Grandes mudanças são cada vez mais necessárias para sobreviver e se tornar eficaz neste novo ambiente. Mais mudanças demandam líderes ainda mais competentes.

“Liderança e gestão são dois sistemas distintos e complementares de ação, ambos necessários para o sucesso de um projeto, de uma equipe ou da organização como um todo”, disse Ferreira. “É possível ser um gestor mediano sem se tornar líder de fato. No entanto, é impossível assumir o papel de liderança sem conhecer a fundo todo o processo de gestão. Liderança trata de um processo completo e complexo”.

Considere uma simples analogia: em tempos de paz, um exército pode sobreviver com uma boa administração, gestão hierárquica, planos de ação e liderança efetiva concentrada no topo. Já, durante uma guerra, é preciso liderança ressonante em todos os níveis de hierarquia. Até hoje, ninguém descobriu como gerenciar pessoas em uma batalha. Neste caso, liderança é imprescindível.

Para o especialista John Gardner, autor do livro On Leadership, os líderes devem entender as necessidades de seus liderados – desde as mais básicas, como renda e cuidados com saúde, até as maiores aspirações – como confiança mútua e respeito – para que possa desenhar novos desafios e visões. Mostrar-se popular e carismático é bem diferente de ser um líder efetivo, que traz resultados. Integridade e autenticidade são características necessárias de todos os líderes. Eles devem ajudar as pessoas a acreditarem que elas podem ser efetivas e alcançar seus objetivos. No entanto, os líderes precisam estar conscientes dos riscos e das respectivas consequências que devem enfrentar ao longo do caminho.

“Foi exatamente isso que o capitão do navio Costa Concordia não fez”, afirmou o Program Director do iPL. “Mesmo tendo, em algum momento, sido um bom líder, a falha fatal de Schettino mostrou que é impossível manter liderança ressonante quando se abandona a gestão. A tripulação até poderia estar engajada com ele no momento em que se decidiu pela manobra do navio para fazer uma homenagem, mas o capitão não soube dimensionar as consequências da mudança de planejamento e os respectivos riscos a que expunha sua equipe.”

Além disso, lembrou Ferreira, diante do erro fatal, Schettino literalmente abandonou o barco. Naquele momento, surgiu um novo líder: o comissário-chefe de bordo do navio, Marrico Giampetroni. Na ausência do capitão, ele ajudou os passageiros a vestirem os coletes salva-vidas e a descerem nos botes, além de ter conseguido manter uma situação de calma relativa durante a operação. Giampetroni foi um dos últimos sobreviventes resgatados, 36 horas depois do acidente.  Toda organização tem, potencialmente, personagens como Giampetroni, com influência sem autoridade formal, e comprometimento total. Esses devem ser reconhecidos, desenvolvidos, recompensados e promovidos. Aqueles que se comportam como Schettino precisam ser orientados, e se não assumirem seus papéis plenos de liderança, realocados ou dispensados. Manter Schettino como Capitão resultou em mortos e feridos. Que potencial de dano podem ter líderes despreparados em sua organização?

Gestão Liderança

Complexidade                                              Mudança

Planejamento e Orçamento                  Definição da Direção

Organização e Contratação                 Alinhamento de Pessoas

Controle                                                        Engajamento

Olhar na “última linha”                         Olhar na “linha do horizonte”

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